Correio do Povo: notícias da nossa cidade em 1935
A proposta do texto é ler o jornal “Correio do Povo” do dia 19 de janeiro de 1935. Temos a intenção de identificar como e quanto o guarulhense daquela época estava informado sobre a sua cidade e seus acontecimentos locais. Partimos de uma dificuldade, ainda presente nos dias de hoje, o acesso a informações locais da nossa cidade.
O acervo de jornais está disponibilizado no portal da AAPAH (https://aapah.org.br/digitalizacao-de-jornais/), o acesso é gratuito e disponibilizado para qualquer pesquisador interessado.
Baseamos na crítica do pesquisador Pedro Celso Campos à Teoria do Espelho, escola teórica muito difundida na metade do século XIX e continuou popular no Brasil, no começo dos anos do século XX.
“A função do jornalista é contar o que viu ou ouviu, doa a quem doer. O jornal é um contra-poder, uma arma política. O jornalista milita no partido do dono do jornal. O jornal é o próprio partido. Pratica-se um jornalismo fortemente opinativo onde poucas pessoas têm a missão diária de combater o Mal e defender o Bem. A dificuldade é definir o que é o Mal (talvez o “eixo do mal”) ou o que é o Bem (talvez uma multinacional que vem gerar “milhares” de empregos..). A ideologia perpassa o jornalismo, por isto é sempre muito perigoso deixar tamanha responsabilidade em poucas mãos, sob o risco de se cometerem terríveis injustiças” (Campos, 2006, pag. 14)
Vamos ao nosso assunto. A periodicidade do “Correio do Povo” desta época era semanal, o jornal não tinha capa destacando as principais notícias, ou seja, a primeira página já tinha conteúdo.
O primeiro texto do jornal é uma coluna intitulada “Trançando”, o autor inicia falando sobre um observador perrepista (admirador do Partido Republicano Paulista) do jornal “Folha da Manhã”. A coluna é uma crítica sobre a economia no Governo Getúlio Vargas e sua tentativa de negociação da dívida externa com os EUA. Já temos um sinal de como pensa o semanário.
Em seguida o próximo título é “Socialismo, communismo e anarchismo”, é uma citação sobre o socialismo pelo viés religioso. O comunismo é citado pelo fim da propriedade privada e a negação de Deus. Já o anarquismo como fim da família e o fim de toda organização social conhecida.
O terceiro assunto é a “A falta de policiamento em nossa cidade”, este o primeiro a falar diretamente sobre Guarulhos. Não há o detalhamento dos casos criminais, mas fala sobre um grupo de salteadores e, a dificuldade de capturá-los por causa da falta de policiais. O autor solicita uma providência do delegado de polícia da época.
O próximo tema é bem peculiar, pois trata sobre os animais soltos pela região central, no caso vacas que se alimentam de gramas verdes e acabavam adentrando a igreja matriz. A redação solicita uma atenção do prefeito para este problema.
O penúltimo texto da página reclama da arrecadação de impostos em Guarulhos. Segundo o jornal, o prefeito Guilhermino Rodrigues de Lima (nomeado pelo Governo do Estado) fazia economia de gastos, mas as ruas continuavam em “estados lastimáveis”.
Para fechar a primeira página, há uma nota de convocação para o Alistamento Militar.
O jornal é iniciado por textos opinativos que deixam clara a sua linha editorial, antigetulista, perrepista e anticomunista. A crítica ao prefeito de Guarulhos da época, nomeado pelo governador Armando Salles, é outro sinal da opinião jornalística, já que este grupo era dissidente do Partido Republicano Paulista, que vinha perdendo espaço político.
Segunda Página
Na segunda página traz dois textos literários, o primeiro texto publicitário que aparece é sobre o Recreio Gianni.
Ainda na segunda página temos os artigos “Rede de Exgotto e Agua Encanada”, “Ainda sobre os ladrões” e uma nota sobre “Festa de S. Sebastião”.
O primeiro conteúdo da página trata sobre o esforço do prefeito Guilhermino, mas destaca a “má vontade dos departamentos” para melhoria das redes de água e esgoto do município.
Já o segundo texto sobre os roubos pede uma atitude enérgica, “sem dó e nem piedade”. Desta vez é descrito a invasão da casa de José Vidal França e a perda de objetos presentes na residência. Lembra os televisivos sensacionalista dos dias de hoje.
Há a nota sobre a Festa de São Sebastião, na Capela de São Roque, destaca a presença da Banda Lira, no bairro dos Alves.
Terceira Página do Correio do Povo
A terceira página é toda de publicidade de comércios locais e há também, algumas empresas do bairro da Penha, em São Paulo.
A quarta página traz o Diário Oficial de Guarulhos, um modo muito comum na época para a prefeitura local informar os cidadãos sobre o erário público e, também era uma forma dos jornais faturarem pela venda do espaço.
Quinta Página
Na quinta página há mais publicidades de comércios de Guarulhos e do bairro da Penha. Há também anúncios de venda de imóveis que poderiam ser tratadas na própria redação do “Correio do Povo”, o jornal neste caso também usava sua sede para o serviço de corretagem de imóveis.

Sexta Página
A última folha do jornal traz uma espécie de coluna social com os aniversariantes, falecimentos e um concurso para escolher a mais bela moça de Guarulhos. Há um chamamento para comissão do carnaval, entre os ilustres estão Miguel Parente (proprietário do jornal), Luiz Faccini, o prefeito Guilhermino (chamado de coronel), Hilario Carbonéll, Reynaldo Poli, entre outros.
Há um título sobre a greve dos motoristas do Estado de São Paulo, na matéria cita que os motoristas de Guarulhos não aderiram à greve. O texto deixa clara a opinião que o semanário era contra o ato. O Correio do Povo fala que uma minoria é responsável pela greve apoiada por pessoas estranhas à categoria, estes seriam do Partido Comunista.
Há uma outra nota sobre crimes na cidade, citando o roubo aos instrumentos musicais na sede da Banda Lira de Guarulhos.
A última página é fechada com resultados dos jogos de futebol e mais anúncios.
Ao ler o exemplar do “Correio do Povo” de janeiro de 1935. Nos deparamos com temas atuais como crimes e questões de infraestrutura. Uma questão importante é a proximidade ao poder, mesmo que em algum texto tenha uma certa oposição ao prefeito da época. Outra observação importante é a contrariedade às manifestações políticas da classe trabalhadora, o que remete aos dias de hoje em que é muito comum os meios de comunicações opinarem contra as greves. O guarulhense daquela época, que lia o citado jornal, recebia opinião de alguém que batia e assoprava nos políticos. Fato ainda muito comum neste tipo de imprensa próxima ao poder.